Às 5h da manhã de 24 de fevereiro de 2022, Sunday Adelaja acordou com o estrondo de explosões em Irpin, nos arredores de Kiev, onde morava próximo a um aeroporto militar. Com o início da invasão russa à Ucrânia, ele rapidamente reuniu sua esposa e quatro estudantes, pegando uma mochila e partindo em direção à fronteira com a Polônia.
Adelaja, fundador de uma das maiores igrejas evangélicas da Europa, a Embaixada do Reino Abençoado de Deus para Todas as Nações, tomou essa decisão acreditando estar em perigo. A sua congregação pentecostal tinha sua sede na Ucrânia, um fato surpreendente dado o histórico ortodoxo do país.
A igreja de Adelaja, conhecida por seu fervor evangélico e abordagem empreendedora, contava com aproximadamente 100 mil membros na Ucrânia e possivelmente milhões em todo o mundo, desafiando a tradição religiosa da região.
Ele se tornou uma figura proeminente local, mas também enfrentou críticas, especialmente após receber avisos do governo de Kiev de que estava na lista de alvos russos. “A luta de Putin se tornou a luta do mundo”, afirmou Adelaja.
Entretanto, enfrentou acusações de fraudes em um esquema de pirâmide, que teriam sido uma tentativa de injustiça contra ele. Apesar de não ter sido condenado por qualquer crime, as polêmicas ao seu redor mancharam sua reputação, especialmente em tempos de guerra.
A narrativa de Adelaja é emblemática do crescente pentecostalismo global, que encontrou apelo em países imersos em trauma, e revela como a religião é utilizada por políticos para alcançar fins pessoais. A habilidade dos pregadores carismáticos em influenciar suas congregações é especialmente evidente em períodos de turbulência.
O evangelho da prosperidade em um cenário de crise
Nascido em uma vila pobre da Nigéria, Adelaja superou desafios significativos, incluindo a infância marcada pela pobreza. Uma bolsa de estudos o levou à União Soviética, onde teve uma experiência transformadora em um culto evangélico na TV, inspirando sua trajetória religiosa.
Ao chegar a Moscou, ficou impressionado com a grandiosidade das igrejas, ainda que soubesse que, sob o regime comunista, eram apenas museus. Com o tempo, ele se fixou na Ucrânia, onde se tornou um correspondente de TV e começou a construir sua igreja.
No início dos anos 2000, sua congregação se expandiu, convertendo-se em uma das maiores redes de igrejas da Europa. Adelaja estava no centro de um aumento global do pentecostalismo e do evangelho da prosperidade, atraindo a atenção de políticos e cidadãos em busca de esperança durante tempos difíceis.
O crescimento da igreja também trouxe desafios, incluindo resistência de figuras tradicionais e investigações sobre possíveis abusos psicológicos em sua congregação. Na Rússia, as reações foram intensas, com alegações de que ele era uma “ferramenta dos EUA” em uma nação histórica com ricas tradições religiosas.
Acusações de envolvimento em um esquema de pirâmide surgiram em 2008, ligando sua imagem a um investimento fracassado que afetou centenas de pessoas. Embora ele defenda sua inocência, o impacto de tais alegações foi inegável, resultando na redução de membros e encerramento de igrejas.
Refugiado e o desejo de retornar
Atualmente, Adelaja reside em Bruxelas e reflete sobre seu retorno à Ucrânia, uma vez que deseja passar a liderança da igreja para outros pastores, mas não pretende permanecer. O impacto da guerra na Ucrânia deixou profundas marcas, com perdas significativas entre seus membros.
Adelaja nutre forte desejo de contribuir com a África, refletindo sobre as injustiças que alguns líderes religiosos perpetraram no continente. Ele se mostra determinado em educar os africanos sobre a realidade de líderes autoritários e a necessidade de discernimento em relação a desinformações disseminadas por esses regimes.
Haverá um futuro para ele na Nigéria? Adelaja afirma que é um desafio que ele está disposto a enfrentar, confiando na força que a fé e a autodeterminação lhe proporcionaram ao longo de sua vida. Ele busca fortalecer comunidades e dar voz aos necessitados, provando que a fé pode ser um poderoso instrumento de mudança, mesmo em tempos de crise.