O governo tem um manual amplamente conhecido para obter e manter poder extraordinário sobre a população, utilizado de forma semelhante em todo o mundo.
Os políticos frequentemente convencem a sociedade de que estão diante de uma ameaça existencial, seja de radicais, terroristas ou qualquer força percebida como perigosa. A solução proposta é a concessão de poderes sem precedentes aos líderes.
Quando surgem preocupações sobre esses poderes, as autoridades garantem que as medidas são “temporárias”. No entanto, a história mostra que raramente são. Após os ataques de 11 de setembro, o governo dos EUA aprovou o “Patriot Act”, que deu poderes radicais de vigilância e detenção ao governo, alegando que eram necessários apenas enquanto a ameaça ao país permanecesse.
Contudo, o uso desses poderes rapidamente se expandiu além de seu propósito inicial e, 24 anos depois, tornou-se parte do cotidiano político americano, sem que muitos questionassem sua validade.
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) também se conferiu poderes extraordinários. O próprio tribunal admitiu essa situação. Em 2019, criou o “inquérito das fake news”, dando ao ministro Alexandre de Moraes poderes quase ilimitados para investigar críticas ao tribunal, que são frequentemente classificadas como “ataques” à democracia.
Durante as eleições presidenciais de 2022, Moraes atuou como o guardião do discurso político online, um papel que transcendeu a autoridade de qualquer entidade democrática. A ministra Cármen Lúcia reconheceu a gravidade da decisão, mas garantiu que os poderes de Moraes eram temporários, com validade apenas até o dia 31 de outubro de 2022.
Entretanto, Moraes manteve e utilizou esses poderes muito além do prazo estipulado. O inquérito das fake news já se aproxima de seu sexto ano, sem perspectiva de encerramento.
Recentemente, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, foi questionado sobre a manutenção desses poderes. Ele sugeriu que a investigação poderia estar próxima do fim, mas essa expectativa se mostra incerta com a proximidade de novos “perigos” que justificam a manutenção desse controle.
O debate continua sobre a legitimidade da concessão de poderes tão radicais. Resta saber se o STF realmente considerará o fim dessas medidas. Se sim, quando acontecerá essa mudança? O futuro das autoridades investigativas e de censura permanece uma questão em aberto, enquanto os cidadãos observam com interesse o desenrolar dessa história.