As mulheres e pessoas que menstruam enfrentam variações em disposição, desempenho e até funcionamento cognitivo ao longo do ciclo menstrual, que se divide em menstruação, fase folicular, ovulação e fase lútea.
Essas flutuações são induzidas por hormônios sexuais como progesterona e estrogênio, e as implicações desses ciclos estão sendo melhor entendidas pela ciência contemporânea.
Um estudo recente publicado na Human Brain Mapping destaca que as variações hormonais ao longo do ciclo menstrual resultam em alterações estruturais no cérebro. Pesquisadoras da Universidade da Califórnia indicam que, além das áreas diretamente relacionadas ao ciclo, a quantidade de massa cinzenta, massa branca e líquido cefalorraquidiano também sofre mudanças, refletindo a progressão das fases do ciclo.
Os resultados mostram que a progesterona, que aumenta durante a fase lútea, está associada ao crescimento do tecido cerebral e à diminuição do líquido cefalorraquidiano. Este estudo foi o primeiro a demonstrar mudanças simultâneas na microestrutura cerebral em relação aos ritmos hormonais menstruais.
Investigações anteriores também associam a progesterona à alteração do volume do lobo temporal medial, uma área do cérebro pertinentemente responsável por funções cognitivas e emocionais. A bióloga e neurocientista Ana Paula Lima destaca que a progesterona pode afetar a plasticidade neural, impactando memória e humor, e interferindo na resposta ao estresse.
No que diz respeito a pessoas que utilizam contraceptivos hormonais, as oscilações hormonais naturais são neutralizadas, mas as mudanças cerebrais ainda podem ocorrer. “Apesar das variações individuais, é certo que a modulação de neurotransmissores do sistema nervoso central é afetada, o que pode resultar em alterações de humor e estabilidade emocional”, explica Lima.
Alterações ao Longo do Ciclo
Segundo a endocrinologista Ruth Clapauch, tanto o estrogênio quanto a progesterona variam ao longo do ciclo de 28 dias. No início da menstruação, os níveis hormonais estão baixos, aumentando gradativamente até o pico no momento da ovulação. Com a produção de progesterona pelo corpo lúteo, os níveis de estrogênio começam a cair, preparando o útero para uma possível fecundação.
A ginecologista Juliana Jordano acrescenta que cerca de 75% das mulheres apresentam alguma alteração na fase lútea, influenciando o bem-estar físico e emocional, embora a sensibilidade a essas mudanças varie de mulher para mulher.
Durante os últimos dias do ciclo, pode-se experienciar o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual (TDPM), que é classificado em graus leves, moderados e graves, com os graus mais severos requerendo tratamento médico.
A especialista ainda afirma que o bem-estar mental pode ser afetado quando os níveis de estrogênio estão baixos, levando a uma sensação de confusão mental conhecida como “Brain Fog”. Em contrapartida, níveis elevados de hormônios podem resultar em maior produtividade.
Esta compreensão sobre os ciclos hormonais reflete na crescente proposta de políticas públicas, como a licença menstrual, que visa oferecer a mulheres dias de descanso remunerado durante períodos de sintomas intensos relacionados ao ciclo. No Brasil, o Projeto de Lei 1.249/22 está em tramitação, buscando validar essa necessidade. Outros países, como Espanha e Japão, já implementaram iniciativas semelhantes.
Além dos desafios físicos, como cólicas menstruais, que afligem muitas mulheres, estudos revelam que uma significativa porcentagem de mulheres jovens sofre com dores menstruais, reforçando a necessidade de reconhecer e abordar essas questões mais eficazmente.
A pesquisa sobre a saúde das mulheres, conforme observado, ainda é insuficiente, resultando em uma lacuna de gênero no campo médico. Um estudo de 2022 revela que as mulheres são sub-representadas em pesquisas, frequentemente levando a diagnósticos e tratamentos inadequados, como evidenciado no caso da endometriose.
Fatores sociais e demandantes, como a carga de trabalho tripla enfrentada por muitas mulheres, também impactam diretamente a saúde hormonal e cerebral, mostrando que a saúde feminina é um campo que merece mais atenção e pesquisa.