No ano seguinte aos trágicos eventos de maio de 2006 em São Paulo, o movimento Mães de Maio, que representa familiares de vítimas de violência policial, trouxe à tona uma questão muitas vezes ignorada: o desaparecimento de pessoas.
O assunto foi levado ao grupo por Francilene Gomes Fernandes, uma estudante de serviço social, durante um evento na capital paulista. “Ela estava distribuindo panfletos com a foto de seu irmão”, conta Débora Maria da Silva, fundadora do Mães de Maio e pesquisadora no Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Unifesp.
O irmão de Francilene, Paulo Alexandre, desapareceu aos 23 anos após uma abordagem policial em maio de 2006. A perda devastou sua família, que anteriormente já havia sofrido a morte da filha Juliana em circunstâncias não esclarecidas nos anos 1990.
Após momentos difíceis, Francilene retornou à faculdade com apoio da pesquisa. “Quando decidiu desenvolver seu trabalho de conclusão sobre violência policial, eu a incentivei”, afirma Camille Aguiar, amiga e assistente social.
A conexão de Francilene com o movimento se consolidou durante seu mestrado, onde recebeu apoio para sua pesquisa. “Eu a considerava uma ‘mãe de maio'”, destaca Débora.
O impacto da violência policial não apenas afetou sua vida pessoal como também sua saúde. Um nódulo na tireoide, inicialmente diagnosticado em 2006, deteriorou-se ao longo dos anos, mesmo após tratamentos.
Apesar dos desafios, Francilene não se deixou vencer. Em 2021, obteve seu doutorado em serviço social na PUC-SP. Nos momentos em que não podia estar presente nas atividades do Mães de Maio, era representada por seu pai. Neste ano, lançou o livro “Tecendo Resistências – Trincheiras Contra a Violência Policial”, com a renda revertida para o movimento.
“Ela transformou a dor da perda em uma luta por justiça”, declara Mariana Coura, ex-aluna de Francilene.
Francilene faleceu em 28 de setembro, aos 44 anos, devido a complicações do câncer. Deixa seu marido, Alex Siqueira, os filhos Julia, Sophia e Noah, além de seus pais. Era uma mulher que amava a família e a Disney, realizando viagens mágicas com cada filho para apresentá-los ao mundo da fantasia.